sábado, 4 de fevereiro de 2012

Norman Geisler, C. S. Lewis: intercessão dos santos e purgatório.

Encontrei um texto interessante onde teólogo protestante Norman Geisler menciona que os santos estão conscientes do que acontece aqui na terra, além de fazerem orações diante de Deus para as cosias que acontecem por aqui. Nesse mesmo trecho ele critica a oração pelos mortos, que por ora não irei comentar, pois, pelo que o texto demonstra, deriva de um certo equivoco do que é a oração pelos os mortos. No entanto, depois desse trecho, segue um texto de outro protestante (C. S. Lewis) demonstrando a incoerência da critica de certos protestantes de se orar para os mortos. (Perceba a diferença de "pelos" e "para" (ou por), que tratarei em outra ocasião).

Segue a citação:

"... os mortos oram pelos vivos (cf. Ap 6:10), mas não há exemplo em toda a inspirada Palavra de Deus de vivos orando por mortos. Os santos martirizados, na glória, são descritos como orando por vingança sobre os ímpios (Ap 6:9) E como há alegria no céu por uma única alma que é salva na terra (Lc 15 10), não há dúvida de que há oração no céu pelos perdidos. Mas a Bíblia não deixa nem mesmo o menor vislumbre de esperança para quem quer que morra em seus pecados [nem o ensino católico] (veja os comentários de 2 Ts 1:9)." (Manual popular de Dúvidas, Enigmas e "Contradições" da Bíblia -Norman Geisler - Thomas Howe. sobre 2 Samuel 12:21-23)

Não irei me alongar para explicar as partes destacadas, o principal objetivo do post é uma reflexão. Fica, para uma reflexão mais ampla, uma citação de C. S. Lewis sobre o assunto:
"Imagino se quem morreu há tempos fica sabendo quando nós enfim, após incontáveis malogros, somos bem-sucedidos em perdoá-los. Seria uma pena se não. Um perdão dado mas não recebido seria frustrado. O que me traz à sua questão.
Claro que eu oro pelos mortos. O ato é ão espontâneo, quase inevitável, que só o argumento teológico mais coercivo seria capaz de me dissuadir. E desconheço como o restante das minhas orações sobreviveria se essas, pelos portos, fossem proibidas. Na nossa idade, a maior parte daqueles a quem mais amamos já morreu. Que tipo de interação com Deus eu poderia ter se aquilo que mais amo não pudesse ser mencionado diante dele?Todavia, não cremos nós que Deus já fez e já está fazendo tudo que pode pelos vivos? O que mais haveríamos de pedir?
 Na visão protestante tradicional, os mortos estão ou condenados ou salvos. Se condenados, orar por eles é inútil. Se salvos, inútil da mesma forma. Deus já fez tudo por eles, o que mais haveríamos de pedir?
Todavia, não cremos nós que Deus já fez e já está fazendo tudo que pode pelos vivos? O que mais haveríamos de pedir? No entanto, é-nos mandado pedir.
'Sim', alguém responderá, 'contudo os vivos ainda estão na estrada. Ulteriores provações, desenvolvimentos, possibilidades de erro aguardam por eles. Os saltos, no entanto, têm sido aperfeiçoados. Terminaram a corrida. Orar por eles pressupõe que progresso e dificuldades ainda são possíveis. Na verdade, você está introduzindo algo como o Purgatório."
Bem, imagino que esteja. Embora seria de supor até no Céu algum incremento perpétuo de bem-aventurança, alcançado por meio de uma autorrendição cada vez mais extasiada, sem a possibildiade de fracasso, mas talvez não sem os ardores e esforços que lhe são próprios - pois o deleite também conta com suas dificuldades e escaladas íngremes, como bem sabem os amantes. Mas não vou insistir nessa questão nem tentar fazer conjecturas sobre ela por enquanto. Eu acredito no Purgatório.
Lembre-se, os reformadores tiveram bons motivos para lançar dúvidas sobre a "doutrina romana concernente ao Purgatório", considerando em que se transformara essa doutrina na época. Não me refiro ao simples escândalo comercial. Se você se desviar do Purgatório de Dante para o século XVI, ficará aterrorizado com a degradação. Em Supplication of Souls [Súplica de almas], de Thomas More, o Purgatório nada mais é que um Inferno temporário. Nele as almas são atormentadas pelos demônios, cuja presença é "mais horrível e penosa para nós que a própria dor". Pior ainda, Fisher, em seu sermão sobre o salmo 6, diz que as torturas são tão intensas a ponto de o espírito que as sofre não ser capaz, por causa da dor, "de lembrar de Deus como deveria fazer". Na verdade, até a etimologia da palavra purgatório já deixou de ser levada em conta. Sua dor não nos traz mais perto de Deus, mas faz que o esqueçamos. É um lugar não de purificação, mas de puro castigo retributivo.
A visão correta se volta esplendorosamente para The Dream of Geronitus [O sonho de Gerontio] de Newman. Ali, se me lembro bem, a alma salva, ao pé do trono, suplica para ser levada embora e purificada. Não consegue suportar nem mais um instante "as trevas que afrontam aquela luz". A religião tem reclamado o Purgatório.
Nossa alma exige o Purgatório, não? Seria de cortar o coração se Deus nos dissesse: "É verdade, meu filho, que você está com o hálito forte e que de seus trapos pingam lama e lodo, mas somos caridosos aqui, e ninguém o repreenderá por essas coisas, nem se apartará de você. Entre no gozo do teu Senhor", não acha? Nós não deveríamos retrucar: "Com submissão, Senhor, se não houver nenhuma objeção, eu preferiria ser purificado primeiro"? "Pode machucar, você sabe..." "Mesmo assim, Senhor."
Suponho que seja normal o processo de purificação envolver sofrimento. Em parte por tradição; em parte porque a maioria do bem real que me tem sido feito nesta vida o tem envolvido. Mas não entendo que o sofrimento seja o propósito da purgação. Poso bem crer que pessoas nem muito piores nem muito melhores do que eu sofrerão menos ou mais do que eu. "Sem disparates envolvendo o mérito." O tratamento dado será o necessário, quer ele machuque muito, quer pouco.
Minha imagem favorita dessa questão vem da cadeira do dentista. Espero que, quando meu dente da vida for arrancado e eu estiver "me recuperando", uma voz diga: "Enxágue a boca com isto aqui". "Isto aqui" seria o purgatório. O enxágue pode durar mais tempo do que sou capaz de imaginar agora. O gosto desse "isto aqui" pode ser mais adstringente e ardente do que minha atual sensibilidade consegue suportar.
Mas More e Fisher não conseguirão me convencer de que será odioso e profano.
Sua própria dificuldade particular - o fato de os mortos não estarem inseridos no tempo - é outra questão.
Como sabe que não estão? Eu com certeza acredito que ser Deus é desfrutar um presente infinito, no qual nada ainda passou e nada ainda está por acontecer. Disso se depreende que podemos dizer o mesmo a respeito de santos e anjos? Ou, pelo menos, exatamente o mesmo? Os mortos talvez experimentem um tempo não tão linear quanto o nosso - que tenha, por assim dizer, espessura, bem como comprimento. Já nesta vida temos alguma espessura sempre que aprendemos a dar atenção a mais de uma coisa de uma só vez. Pode-se supor essa situação ampliada a qualquer medida, de modo que, embora, para eles tanto quanto para nós, o presente esteja sempre se tornando o passado, ainda assim cada presente contenha inimaginavelmente mais do que o nosso.
Tenho a impressão - você consegue resolver o problema para mim e me dizer se é mais de uma impressão? - de que revestir a vida dos mortos benditos de uma atemporalidade rigorosa é incoerente com a ressurreição do corpo.
De novo, como você e eu concordamos, quer oremos em benefício dos vivos, quer dos mortos, as causas que impedirão ou excluirão os acontecimentos pelos quais oramos na verdade já estão operando. Na verdade, fazem parte de uma série que, suponho eu, remonta à criação do Universo. As causas que fizeram da enfermidade de George uma coisa trivial já estavam em operação enquanto orávamos acerca dela; se fosse o que temíamos, suas causas também teriam estado operando. É por isso, conforme eu sustento, que nossas oraões são atendidas ou não na eternidade. A incubência de promover o encaixe perfeito entre histórias espirituais e físicas do mundo umas nas outras se realiza por completo no próprio ato da criação. Nossas oraçõse, e outros atos livres, nos são atos da criação. Nossas orações, e outros atos livres, nos são conhecidas apenas quando atingimos o momento de fazê-las. Mas elas têm participação eterna na partitura da grande sinfonia. Não são "predeterminadas"; o prefixo pré dá lugar à noção de que a eternidade não passa de um tempo mais antigo. Pois, embora não sejamos capazes de experimentar nossa vida como um presente sem fim, somos eterno aos olhos de Deus; ou seja, em nossa realidade mais profunda. Quando digo que estamos "no tempo", não quero dizer que estejamos, impossivelmente, fora do presente infinito em que Ele nos observa, como observa tudo o mais. Quero dizer, nossa limitação como criaturas pode ser experimentada por nós só no modo de sucessão.
Na verdade, começamos introduzindo a questão da maneira errada. A questão não é se os mortos fazem parte da realidade atemporal. Eles fazem; o mesmo acontece como lampejo do raio. A questão é se eles compartilham da percepção divina da atemporalidade." (Oração: cartas a Malcom, na carta XX)
Enfim... que esses textos sirvam para que você que critica a intercessão dos santos e o purgatório perceba que não é incoerente e anti-bíblico. Pelo contrário, geralmente quando se critica a intercessão dos santos, se faz a um espantalho criado exatamente para desviar a atenção da verdade. Se quer criticar a doutrina, façam, mas não critiquem uma imagem distorcida achando que estão fazendo um bem. Não faz mal ser honesto quanto a isso, pelo contrário, faz muito bem! Quem sabe assim, com exemplos de protestantes (assim como vários que já citei aqui) que os fanáticos, que não são todos, parem com essa birra.

Isso não foi colocado para demonstrar biblicamente. Para isso há vários textos tanto aqui quanto em outros lugares. É uma forma de explicar o conceito. A partir de um real conceito (não das fantasias de alguns delirantes) se pode fazer uma crítica coerente.

Já está mais do que na hora de certos teólogos protestantes estudarem melhor suas doutrinas, e, se forem criticar a doutrina católica, que critiquem-na em si, e não sua distorção. Ler um livrete aqui e ali contra a Igreja não significa necessariamente que estudaram a fundo. Aliás, o fato da maioria dos críticos protestantes falarem sempre contra a sua imagem distorcida se deve a isso.

Está mais do que na hora de termos debates sensatos e honestos. Cabe agora aos protestantes honestos confrontarem o que aprenderam com a real doutrina Católica.