quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Deus – A Trindade. (Parte I)


Retirado do livro "Etudes sur Dieu, l'Eglise, le Pape e sur le surnature" do Padre Jean-Baptiste Aubry.
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I. Se Deus é um Deus vivente, se a vida está nEle, é necessário que ela participe de sua perfeição. Entretanto, a perfeição da vida se termina, se consuma, em três graus: O Ser, o Pensamento e O Amor. Nós devemos, portanto, encontrar em Deus estes três graus; não se pode dividir sua substância em três, tanto porque esta substância repugna nela mesma toda divisão quanto porque estas três substâncias não têm, por sua propriedade, divisão entre elas na substância em que elas estão, mas mantêm-se uma única substância. Como não pode haver em Deus nada de real e subsistente que não tenha sua personalidade completa, é necessário que tenha em Deus três pessoas distintas.

A união, a distinção e as relações das três pessoas podem ser estudadas à luz do que nós portamos (o que faz parte de nossa natureza) e do que podemos observar.

A geração do Verbo pelo Pai, ou seja, do pensamento ou palavra interior, é o tipo da nossa; por conseqüência, a nossa pode dar uma idéia dela. Ela é a primeira e excelente realização na atividade do Ser divino, exercício da inteligência ou pronunciação do Verbo interior.

A geração de nosso pensamento em nós e a pronúncia de nossa palavra interior é, assim, nossa operação mais elevada; mas nós somos seres finitos e inferiores, assim, esta operação em nós não pode lembrar em tudo à operação divina. Não pode, sobretudo, conduzir à produção de um verbo subsistente e pessoal. Ela não é mais que um desdobramento*. Porém, ela porta todas as características de uma geração intelectual que lembra a geração eterna do Verbo divino.

A procissão do Espírito Santo, amor mútuo do Pai e do Filho, pode, da mesma maneira, ser estudada sobre o tipo que nós portamos. Qual é, em nós, o objeto e a causa do amor? Nossa semelhança que vemos no outro. A paternidade produz um filho à imagem do pai e objeto de seu amor. Assim é em Deus, onde o Filho é a imagem e o esplendor do Pai. Mas em nós, este amor não é mais que um sentimento, uma relação, e não o termo subsistente de uma relação. Em Deus, é necessário que se tenha um termo subsistente de uma relação.

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II. Como nos assombra encontrar três pessoas em uma natureza, se nós portamos em nós mesmos duas naturezas em uma pessoa? Um é mais compreensível que o outro? E se negamos a primeira porque é incompreensível, porque não negamos a segunda?

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III. Passei longos tempos meditando ou fazendo simples comparações pouco engenhosas, à maneira dos escolásticos, buscando em todas as criaturas um reflexo, uma semelhança da Trindade e também de outros mistérios da fé, analogias que eles buscavam sobretudo entre a maneira que as atribuições do homem procedem de alguma forma uma da outra e a relação entre as pessoas divinas.

Entretanto, hoje eu creio que essas comparações e analogias têm um fundamento real em uma real semelhança. Com efeito, uma vez que Deus fez tudo que existe nos dois mundos, espiritual e material, e toda criatura é a expressão de seu poder, é necessário que sua vida intima seja reproduzida, seja impressa, leve sua expressão, e, assim, tenha o reflexo da vida divina. Pode ser que haja engano na maneira de encontrar, mas se não buscar não se vai encontrar; Deus é o ideal de tudo, não um ideal abstrato, impessoal, privado de existência real, mas um ideal existente, ou o tipo e exemplar ao mesmo tempo em que é autor.


* Nota do tradutor: A palavra original é adobration. Não encontrei o significado desta palavra, e, por isso, tentei deduzi-la pelo contexto. Caso alguém a encontre, e seja diferente, eu ficaria grato ser corrigido.