quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Transposição.



Este texto de C. S. Lewis mostra porque o Deus apresentado na bíblia não é um ser com forma humana, mas o contrário, e que a forma que foi apresentada foi necessário para entendê-lo.

"Vamos construir uma fábula. Vamos imaginar uma mulher lançada numa masmorra. Aí ela dá à luz e cria um filho. Esse menino cresce não vendo nada além das paredes do calabouço, a palha do chão e uma pequena nesga de céu através da grade, tão alta que não permite ver mais nada além do firmamento. Essa infeliz mulher era artista e, quando a prenderam, conseguiu carregar consigo um bloco de desenho e uma caixa de lápis. Como nunca perde a esperança de liberdade, ensina constantemente o filho acerca do mundo exterior que ele jamais viu. Ela faz isso principalmente desenhando gravuras para ele. Com o lápis ela tenta mostrar-lhe como são os campos, os rios, as montanhas, as cidades e as ondas do mar.

O menino é muito obediente e faz o melhor que pode para acreditar na mãe quando lhe conta que o mundo lá fora é muito mais interessante e mais gloriosos que tudo naquela masmorra. Às vezes ele consegue. No geral, ele vai razoavelmente bem até que um dia diz algo que faz a mãe parar por alguns instantes. Durante alguns minutos eles não se entendem, parece que estão falando de coisas diferentes. Por fim, ela percebe que o menino, todos aqueles anos, vivia com uma concepção equivocada. “Mas”, ela exclama perdendo o fôlego, “você não achava que o mundo real é cheio de linhas desenhadas de lápis, não é”?, o menino pergunta. “Não há traços de lápis lá?”. Imediatamente toda a sua noção do mundo exterior se apaga, se transforma em nada. Porque as linhas, por meio somente das quais ele imaginava o mundo, agora lhe foram negadas. Ele não tem idéia daquilo que excluirá e dispensará com as linhas, naquilo de que as linhas eram tão somente uma transposição – as copas das arvores balançando ao vento, a luz dançando no açude, as realidades tridimensionais que não se encerram pelas linhas, mas definem suas próprias formas a todo momento com a delicadeza e multiplicidade que nenhum desenho jamais pode alcançar. A criança ficará com a idéia de que o mundo real é de alguma forma menos visível que as gravuras de sua mãe. Na realidade, faltam traços ao mundo real, porque ele é incomparavelmente mais visível.

O mesmo ocorre conosco. “Não sabemos nada a respeito do que seremos”; mas podemos ter certeza de que seremos mais, não me nos, do que fomos na terra. Nossas experiências naturais (sensoriais, emocionais e imaginativas) são apenas como os desenhos, como linhas traçadas por um lápis numa folha plana. Se eles desaparecerem na vida da ressurreição, sumirão apenas como os traços de lápis desaparecem da paisagem real, não como uma chama de uma vela que se apaga, mais como uma chama de vela que se torna invisível porque alguém tirou a venda, escancarou a veneziana e deixou entrar o fulgor do sol nascente."

Retirado do livro "Peso de Glória", de C. S. Lewis.


Penso da mesma forma que Lewis, não apenas sobre como será as coisas preparadas para nós, mas quando a bíblia fala de como Deus é, agiu e age. Afinal, Deus é maior do que tudo que conhecemos e não conhecemos. Como poderíamos entende-lo se não fosse dessa forma? E o céu, que olho algum viu, e mente nenhuma conseguiu imaginar o que Deus tem preparado para nós?

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