2º
Sentido e conteúdo da definição que estabelece a distinção entre
Deus e o mundo. O Concílio passa a abordar o tema da distinção
entre Deus e o mundo. Já em 1215, o IV Concílio de Latrão havia
condenado o panteísmo de Amaury de Chartres, considerando-o mais
como uma aberração que como uma heresia. A reaparição e
desenvolvimento deste erro exigia uma definição mais explícita e
fundada. O Concílio define, pois, a distinção entre Deus e o
mundo, e indica as principais provas desta doutrina. Tais provas se
reduzem a três: Deus quit cum sit uma singularis, simplex omnino
et incommutabilis substantia spiritualis, praedicandus est re et
essentia a mundo distinctus. 1º Deus é único por natureza: é
o mesmo que dizer que não se pode multiplicar a natureza de Deus em
muitos seres, e não pode estar realizada senão em um só Deus. O
ser de Deus é, portanto, real e essencialmente distinto do mundo,
pois nos encontramos com multiplicidade de gêneros, espécies e
indivíduos. 2º Deus é absolutamente simples: o ser de Deus é real
e essencialmente distinto do mundo, no qual comprovamos três classes
de composição: a composição física (partes integrantes dos
corpos, que são fisicamente distintas entre si), a composição
metafísica (essência suscetível de existir e existência),
composição lógica (gênero e diferença específica). 3º Deus é
imutável: o ser de Deus é, portanto, real e essencialmente distinto
do mundo, pois comprovamos em todas as partes a mudança ou a sua
possibilidade. O Concílio distingue precisamente: re et essentia
a mundo distinctus. Não é uma distinção de razão nem uma
distinção virtual, como a que existe entre os atributos divinos,
mas uma distinção real, em virtude da qual Deus e o mundo são duas
realidade e não uma única realidade. Esta distinção não é
apenas real, como a que existe entre dois indivíduos de uma mesma
espécie, mas é também essencial, é dizer que Deus é, por
essência, distinto do mundo. O Canon 3º também determina,
rejeitando o panteísmo em geral, que concebe a Deus como uma
substância imanente ao mundo, e às coisas finitas como acidentes
desta substância. “Seja anátema quem disser que a substância ou
essência de Deus e de todas as coisas são a mesma”. Finalmente,
esta distinção é infinita. Deus basta a si mesmo: “Bem
aventurado em si e por si, e inefavelmente excelso sobre tudo que há
ou se pode conceber fora Dele”.
Quatro
cânones correspondem a este parágrafo da Constituição Dei Filius.
O primeiro condena o ateísmo: “Seja anátema quem negar o único
verdadeiro Deus, Criador e Senhor das cosias visíveis e invisíveis”.
O segundo condena o materialismo: “Seja anátema quem não sentir
vergonha de afirmar que nada existe fora da matéria”. O terceiro
condena o princípio do panteísmo: “Seja anátema quem disser que
a substância ou essência de Deus e de todas as cosias são uma
mesma”. O quarto condena as três principais formas de panteísmo:
o panteísmo emanatista, o panteísmo essencial de Shelling e o
panteísmo essencial do ser universal: “Seja anátema quem disser
que as coisas finitas, tanto corporais como espirituais, ou, apenas
as espirituais, são imanados da substância divina; ou que a
essência divina, por manifestação ou evolução de si mesma,
transforma-se em todas as coisas; ou, finalmente, que Deus é o ser
universal e indefinido que constitui, determinando-se, a
universalidade das cosias e sua distinção em gêneros, espécies e
indivíduos”. Em relação a este último Canon, há de se pôr as
teorias rosminianas condenadas pelo decreto do S. Ofício de 14 de
dezembro de 1887, e as proposições ontologistas condenadas pela
mesma Congregação em 18 de setembro de 1861. Observe a continuação
destas proposições: “O ser que compreendemos em todas as coisas e
sem o qual nada compreendemos é o ser divino”. “Os universais
considerados da parte do objeto não se distinguem realmente de Deus”
(Denzinger, n. 1660 [1517]; 1661 [1518].)
Temos
aqui o que a Igreja nos ensina sobre a existência de Deus, sua
natureza, atributos essenciais e sua distinção do mundo.
A tais doutrinas, o Concílio Vaticano agrega as relativas à Criação
e Providência: “A causa de sua bondade e por sua virtude
onipotente, não para aumentar sua beatitude nem para adquirir sua
perfeição, mas para manifesta-la pelo bem que dispensa às
criaturas, este único Deus verdadeiro, por desígnio absolutamente
livre, feito do nada simultaneamente no começo do tempo, as
criaturas espirituais e corporais, os anjos e o mundo e depois a
criatura humana, como reunindo espírito e corpo em sua constituição.
“Deus, por sua Providência, conserva e governa tudo o que fez,
[sua sabedoria] se estende poderosa de um a outro lado e o governa
totalmente com suavidade” (Sab. VIII, 1). Porque as coisas são
todas nuas e manifestas aos olhos Dele (Heb. IV, 13), ainda aquelas
que se produzirão no futuro pela livre ação das criaturas”. Não
se poderia dizer com Abelardo que Deus não pode impedir o mal
(Denzinger, n. 375), nem que quer o mal da mesma forma que o bem
(Denzinger, n. 816). É impossível que queira o pecado, pois pode
apenas permiti-lo (Denzinger, n. 816).
Não há por que apresentar aqui a doutrina da Igreja sobre os
mistérios divinos propriamente sobrenaturais, como a Santíssima
Trindade.
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