segunda-feira, 11 de junho de 2012

Origem do Alcorão (5) - Argumentos da precisão científica e da estrutura matemática.

Os artigos anteriores sobre o assunto podem ser vistos aqui: Primeira parte / Segunda parte / Terceira parte / Quarta parte.

Argumento da precisão científica. Esse argumento conquistou popularidade recentemente, principalmente por causa do livro de Maurice Bucaille "A Bíblia, o Alcorão e a ciência", no qual o cristianismo é atacado por impedir o progresso da ciência, e o Alcorão é exaltado por promovê-la. Na verdade, ele insiste que o Alcorão previu maravilhosamente a ciência moderna em várias de suas afirmações, confirmando assim de forma miraculosa sua origem divina.

Mas o cristianismo, não o islamismo, foi o pai da ciência moderna. M. B. Foster, ao escrever para o reconhecido jornal inglês de filosofia Mina [Mente] observou que a doutrina cristã da Criação é a origem da ciência moderna (v. Foster, Whitehead, p. 3-4). Os fundadores de quase todas as áreas da ciência moderna foram cristãos trabalhando com base na sua cosmovisão. isso inclui homens como Nicolau Copérnico, Johannes Kepler, William Kelvin, Isaac Newton, Blaise PASCAL, Robert Boyle, James Clark Maxwell e Louis Agassiz.

Portanto, apesar de o monoteísmo islâmico ter feito muitas contribuições para a cultura moderna, é exagero reivindicar-lhe crédito para a origem da ciência moderna. Os exércitos islâmicos destruíram vastas fontes de conhecimento. Pfander, por exemplo, menciona que, sob o califa Omar, os soldados muçulmanos destruíram vastas bibliotecas em Alexandria e na Pérsia. Quando o general perguntou a Omar o que devia fazer com os livros, acredita-se que ele respondeu: "Lance-os nos rios. Pois, se nesses livros há sabedoria, temos sabedoria ainda melhor no Livro de Deus. Se, pelo contrário, há neles algo que causará desvio, Deus nos proteja deles" (Pfander, p. 365).

É um erro supor que um livro é inspirado só porque se conforma à ciência moderna (v. CIÊNCIA E A BÍBLIA). Apologistas muçulmanos e cristãos cometeram o erro de supor a verdade de um sistema de conhecimento científico específico. O conhecimento científico muda. Assim, o que parecia ser "harmonia5 pode desaparecer. Ao tentar ver teorias científicas modernas em seus "livros sagrados", erros embaraçosos foram cometidos por seus defensores.

Mesmo que se pudesse demonstrar perfeita harmonia entre o Alcorão e os fatos científicos, isso não provaria sua inspiração divina. Simplesmente provaria que o Alcorão não cometeu nenhum erro científico. Na melhor das hipóteses, a precisão científica é um teste negativo da verdade. Se erros fossem encontrados, isso provaria que ele não é a Palavra de Deus. O mesmo se aplica à Bíblia ou a qualquer outro livro religioso. É claro que, se um livro antecipasse de maneira constante e precisa, com séculos de antecedência, o que só viria a ser descoberto mais tarde, isso poderia ser usado num contexto teísta para indicar uma fonte sobrenatural. Mas o Alcorão não demonstra nenhuma evidência de predições sobrenaturais como a Bíblia.

Alguns críticos questionam quão cientificamente preciso o Alcorão é. Por exemplo, a afirmação altamente controversa do Alcorão de que os seres humanos são formados a partir de um coágulo de sangue. A surata 23, versículo 14 diz:
Então, convertemos a gota de esperma em algo que se agarra (coágulo), transformamos CSSQ algo em pequeno pedaço de carne e convertemos o pequeno pedaço de carne em ossos; depois, revestimos os ossos de carne....
Essa dificilmente é uma descrição científica do desenvolvimento embriônico. Para evitar o problema, Bucaille reinterpreta o versículo, traduzindo a palavra árabe yakk [coágulo] por "qualquer coisa que se agarra" (Bucaille, p. 204). No entanto, isso é questionável. É contrário à obra de autoridades islâmicas reconhecidas que fizeram as principais traduções para o inglês. E o próprio Bucaille reconheceu que ‘pasta de sangue’, que figura comumente nas traduções,é uma inexatidão.."(p.233). Isso dá a impressão de que sua tradução caseira foi gerada para resolver o problema, já que reconhece que "uma afirmação desse tipo é totalmente inaceitável para cientistas especializados no assunto" (ibid.).

Da mesma forma, outros críticos observam que na surata 18 versículo 86 o Alcorão fala de alguém viajando para o ocidente "Até que, chegando ao poente do sol, viu-o pôr-se numa fonte fervente". Mas até na tentativa de explicar esse problema, Yusuf Ali admite que isso tem "intrigado os comentaristas". E ele não explica realmente o problema, apenas afirma que isso não pode ser "o extremo oeste, pois tal coisa não existe" (Ali, p. 754, n. 2430). Na realidade, não há extremo oeste, e ninguém que viaja para o oeste chega ao lugar onde o sol se põe. Mas é isso que o texto diz, por menos científico que seja. Outros notaram que a suposta antevisão científica do Alcorão é altamente questionável. Kenneth Cragg observa:
Alguns exegetas do Alcorão afirmavam freqüentemente que invenções modernas e dados científicos, até fissão nuclear, foram previstos ali e agora podem ser detectados em passagens não reconhecidas até agora em sua presciência. Significados anteriormente desconhecidos se revelam à medida que a ciência progride. Essa conclusão, no entanto, "é altamente repudiada por outros como o tipo de corroboração de que o Alcorão, como escritura 'espiritual5, não precisa nem aprova" (Cragg, p. 42).
Mesmo se provassem que o Alcorão é cientificamente preciso, ele não seria divinamente autorizado. Tudo que a precisão prova é que o Alcorão não cometeu erros científicos. Isso não seria inédito. Alguns teólogos judeus afirmam o mesmo a respeito da Tora e muitos cristãos afirmam exatamente a mesma coisa a respeito da Bíblia, usando argumentos bem semelhantes. Mas Bucaille não concordaria que isso prova que o AT e o NT são a Palavra de Deus.

Argumento da estrutura matemática. Uma prova popular da origem divina do Alcorão é sua suposta base milagrosa no número 19. Dezenove é a soma do valor numérico das letras da palavra “um” (com base na crença básica de que Deus é um). Tal método apologético não é bem aceito nos círculos científicos por boas razões. Nenhum muçulmano aceitaria uma mensagem que afirma ser de Deus se ensinasse idolatria ou imoralidade. Certamente nenhuma mensagem contendo tais afirmações seria aceita apenas por motivos matemáticos. Portanto, mesmo se o Alcorão fosse um "milagre” matemático, isso não seria suficiente para provar que era de Deus, mesmo para muçulmanos inteligentes.

Mesmo que a probabilidade for muito alta contra o Alcorão ter todas essas combinações incríveis do número 19, isso não prova nada além de que há uma ordem matemática por trás da linguagem do Alcorão. Como a linguagem é uma expressão da ordem do pensamento humano e como essa ordem pode ser reduzida à expressão matemática, não é anormal que uma ordem matemática possa ser encontrada por trás da linguagem de um documento. Na verdade, não há nada de tão anormal sobre sentenças que têm dezenove letras.

Além disso, o mesmo tipo de argumento (baseado no número 7) foi usado para "provar" a inspiração da Bíblia. Pegue o primeiro versículo da Bíblia "No princípio criou Deus os céus e a terra \ G. Nehls indica que:
O versículo consiste em 7 palavras hebraicas e 28 letras (7 x 4).Há três substantivos: "Deus, céus, terra". Seu valor numérico [...] é 777 (7 x 11). O verbo "criou" tem o valor 203 (7 x 29). O objeto está contido nas três primeiras palavras — com 14 letras (7 x 2). As outras quatro letras contêm o sujeito — também com 14 letras (7 x 2) [e assim por diante].
Mas nenhum muçulmano permitiria que isso valesse como argumento a favor da inspiração divina da Bíblia. No máximo o argumento é esotérico e não convincente. A maioria dos estudiosos muçulmanos inclusive evita usá-lo.

Um comentário:

  1. Gostei bastante da crítica, de fato (infelizmente) o argumento cientifico é ainda recorrente diga-se de passagem numa linha de pensamento popular entre alguns amigos islâmicos.

    Um forte abraço amigo Jonadabe.

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