sábado, 25 de outubro de 2008

O "Novo Ateísmo"

Texto retirado do Apêndice A do livro Um ateu garante: Deus existe, Antony Flew

O "Novo Ateísmo": Uma apreciação critica de Dawkins, Dennett, Wolpert, Hárris e Stenger

Roy Abrahám Varghese


Na base do "novo ateísmo" reside a crença de que não existe Deus, de que não há uma Fonte eterna e infinita de tudo o que existe. Essa e a crença-chave que precisa ser estabelecida para que a maioria dos outros argumentos faça sentido. Minhá presente alegação e a de que os "novos ateístas", Richárd Dawkins, Daniel Dennett, Lewis Wolpert, Sam Hárris e Victor Stenger não apenas falham na defesa de sua tese, como também ignoram os fenômenos que são particularmente relevantes a questão da existência de Deus.

A meu ver, cinco fenômenos apresentam-se evidentes em nossa experiência imediata que podem apenas ser explicados em termos da existência de Deus. A saber: em primeiro lugar, a racionalidade implícita a toda nossa experiência do mundo físico; em segundo, a vida, a capacidade de agir de forma autônoma; em terceiro, a consciência, a capacidade de estar ciente; em quarto, o pensa mento conceitual, o poder de articular e entender símbolos com significado, tais como aqueles inerentes a linguagem e, por fim, em quinto lugar, a personalidade humana, o "centro" da consciência, do pensamento e da ação. Três coisas devem ser ditas sobre esses fenômenos e sua aplicação a existência de Deus. Em primeiro lugar, estamos acostumados a ouvir falar de argumentos e provas da existência de Deus. De meu ponto de vista, tais argumentos são úteis na articulação de certas percepções fundamentais, mas não podem ser considerados "provas", cuja validade formal determinaria se há ou não um Deus. Em vez disso, cada um dos cinco fenômenos tratados aqui pressupõe, a sua maneira, a existência de uma Mente eterna e infinita. Deus e a condição que da supor-te a tudo aquilo que, em nossa experiência, e evidente por si só. Em segundo lugar, como se torna evidente a partir da primeira observação, não estamos falando so­bre probabilidades e hipóteses, mas sim sobre encontros com realidades fundamentais que não podem ser negadas sem que se caia em contradição. Em outras palavras, não aplicamos teoremas de probabilidade a certos conjuntos de dados, mas consideramos a questão muito mais básica sobre como, afinal, a ação de avaliar dados e possível. Da mesma forma, não se trata de uma questão de se deduzir Deus a partir da existência de certos fenômenos complexos. Ao contrario, a existência de Deus e pressuposta por todos os fenômenos. Em terceiro lugar, os ateístas, os velhos e os novos, têm se queixado de que não há evidencias da existência de Deus, enquanto cer­tos teístas respondem que nosso livre-arbítrio só pode ser preservado se tal evidencia não for coerciva. A abordagem tomada aqui e a de que temos toda a evidencia necessária em nossa própria experiência direta da realidade, e que apenas uma recusa proposital de "olhar" poderia ser responsável pelo ateísmo, em qualquer de suas formas.

Ao considerarmos nossa experiência imediata, vamos fazer um experimento mental. Imagine estar diante de uma mesa de mármore. Você acha que, apos um trilhão de anos, ou mesmo um tempo infinito, aquela mesa po­deria tornar-se, repentina ou gradualmente, consciente, ciente do ambiente que a circunda, de sua própria identidade, da mesma forma que você? E simplesmente inconcebível que tal coisa viesse ou pudesse vir a acontecer. E o mesmo e verdade para qualquer tipo de matéria. Uma vez que você compreende a natureza da matéria, da relação massa-energia, percebe que, por sua própria nature­za, a matéria nunca poderia tornar-se //ciente,/, nunca poderia "pensar", nunca poderia vir a pronunciar //eu,/. Mas a posição ateísta e a de que, em algum ponto da historia do universo, o impossível e o inconcebível aconteceram. Matéria não diferenciada — e aqui nos incluímos energia —, em algum ponto do tempo, tornou-se "viva", depois consciente, depois conceitualmente proficiente e finalmente um "eu". Mas voltando a nossa mesa, vemos que tal idéia e simplesmente ridícula. A mesa não tem nenhuma das propriedades de um ser consciente e, dado um tempo infinito, não pode "adquirir" tais pro­priedades. Mesmo que se recorra a algum cenário absurdo sobre a origem da vida, será necessário abrir mão da própria razão para sugerir que, dadas certas condições, um pedaço de mármore poderia passar a produzir conceitos. E, num nível subatômico, aquilo que e valido para a mesa e valido para toda a matéria restante do universo.

Ao longo dos últimos trezentos anos, a ciência empírica desvendou mais dados sobre o mundo físico do que jamais poderia ser imaginado por nossos ancestrais. Isso inclui um entendimento amplo da genética e das redes neurais que sustentam a vida, a consciência, o pensamento e o ser. Mas alem de dizer que esses quatro fenômenos operam sobre uma infra-estrutura que e mais bem compreendida hoje do que jamais foi, a ciência nada pode afirmar sobre a natureza e a origem dos próprios fenômenos. Embora alguns cientistas tenham tentado explica­r como manifestações da própria matéria, não há maneira possível de se demonstrar que meu entendimento dessa sentença nada mais e do que uma transação neurológica especifica. Concordo que há transações neurais que acompanham meus pensamentos, e a neurociência moderna já identificou precisamente as regiões do cérebro que dão suporte a diferentes tipos de atividade mental. Mas afirmar que dado pensamento e apenas uma transação neurológica especifica e tão insensato quanto sugerir que a idéia de justiça nada mais e que algumas marcas de tinta sobre o papel. E incoerente, portanto, sugerir que a consciência e o pensamento sejam apenas e tão somente transações físicas.

Dado o espaço limitado deste documento, apresento uma revisão extremamente condensada dos cinco fenômenos fundamentais que dão suporte a nossa experiência do mundo e que não podem ser explicados dentro da estrutura do "novo ateísmo". Um estudo mais detalhado poderá ser encontrado em meu próximo livro, The Missing Link (O elo perdido).


RACIONALIDADE

Dawkins e outros perguntam quem criou Deus. nesse ponto, claramente, teístas e ateístas podem concordar sobre uma coisa: se algo existe, deve ter havido algo que o precedeu, que sempre havia existido. Como essa realidade eternamente existente poderia ter surgido? A resposta e que ela nunca "surgiu". Faça sua escolha: seja Deus ou o universo, alguma coisa sempre existiu.

E precisamente neste ponto que o tema da racionalidade volta ao primeiro piano. Contrariamente aos protestos dos ateístas, há uma grande diferença entre o que teístas e ateístas afirmam sobre essa entidade que sem­pre teria existido. Os ateístas dizem que a explicação para o universo e a de que simplesmente ele sempre teria existido, mas não conseguimos explicar como esse estado eternamente existente teria surgido. Esse seria um fato inexplicável e deveríamos aceita-lo como tal. Os teístas, no entanto, são determinados em afirmar que, em ultima analise, Deus não e algo inexplicável: a existência de Deus e inexplicável para nos, mas não para o próprio Deus.

Tal existência eterna de Deus deve ter sua própria lógica interna e visível, porque só pode haver racionalidade no universo se ela estiver baseada em uma racionalidade definitiva e maior. Em outras palavras, fatos singulares tais como nossa capacidade de entender e explicar verdades, a correlação entre o funcionamento da nature­za e nossas descrições abstratas desse funcionamento — aquilo que o físico Eugene Wigner chamou de eficácia irracional da matemática —, e o papel dos códigos — sis-temas de símbolos que atuam no mundo físico —, tais como o código genético e o neural, nos níveis mais fundamentais da vida, manifestam, por sua própria existência, a natureza abrangente e fundamental da racionalidade. O que essa lógica interior realmente e, não podemos ver exatamente, embora idéias tradicionais sobre a natu­reza de Deus certamente dêem alguns indícios. Por exemplo, Eleonore Stump e Norman Kretzmann argumentam que o atributo divino da simplicidade absoluta, quando completamente compreendido, ajuda a mostrar por que Deus não pode não existir. Alvin Plantinga afirma que Deus, entendido como Ser necessário, existe em todos os mundos possíveis.

Os ateístas podem responder de duas maneiras: o universo pode ter uma lógica interna motivando sua existência, que não podemos ver, e/ou não precisamos acreditar que tem de haver um Ser (Deus) com sua própria lógica interior para existir. Sobre o primeiro ponto, os teístas afirmarão que não há tal coisa como um "univer­so" que existe alem da soma total de todas as coisas que o constituinte, e sabemos, de fato, que nenhuma das coi­sas do universo tem qualquer lógica interior motivando uma existência sem fim. Sobre o segundo ponto, os teístas simplesmente argumentam que a existência da racionalidade que nos inequivocamente percebemos — desde as leis da natureza ate nossa capacidade de pensamento racional — não pode ser explicada se não estiver baseada em um substrato definitivo, que não pode ser nada menos do que uma Mente infinita. "O mundo e racional", afirmou o grande matemático Kurt Godel. A relevância dessa racionalidade e que "a ordem do mundo reflete a ordem da mente suprema que o governa". A realidade da racionalidade não pode ser evitada com qualquer apelo a seleção natural. A seleção natural pressupõe a existência de entidades físicas que interagem de acordo com leis especificas e de um código que rege os processos da vida. Falar de seleção natural e assumir que há alguma lógica naquilo que acontece na natureza — adaptação —, e que nos somos capazes de compreender essa lógica.

Voltando ao exemplo anterior, da mesa de mármore, estamos dizendo que a racionalidade fundamental ao nosso pensamento, e que encontramos em nosso estudo de um universo matematicamente preciso, não poderia ter sido gerada por uma pedra. Deus não e um fato bruto, mas sim a Racionalidade definitiva que permeia cada dimensão do ser.

Uma nova, apesar de implausível, proposta a questão da origem da realidade física e a tese de Daniel Dennett de que o universo "cria a si mesmo ex nihilo, ou a partir de algo que e virtualmente indistinguível do nada". Essa idéia foi apresentada com maior clareza por outro novo ateísta, o físico Victor Stenger, que apresenta sua própria solução para as origens do universo e as leis da natureza em Not By Design: The Origin of The Universe, Hás Science
Found God?) The Comprehensible Cosmos
e em God: The Failed Hipothesis..Entre outras coisas, Stenger oferece uma nova crítica a idéia das leis da natureza e de suas supostas impli­cações. Em The Comprehensible Cosmos, ele sustenta que essas assim chamadas leis não são impostas "do alto", nem são restrições inerentes ao comportamento da matéria. Elas são simplesmente restrições a maneira como os físicos conseguem formular as afirmações matemáticas sobre suas observações. A defesa de Stenger e basea­da em sua interpretação de uma idéia chave na física moderna, a idéia de simetria. De acordo com diversas explicações da física moderna, simetria e qualquer tipo de transformação que preserva inalteradas as leis físicas que se aplicam a um sistema. A idéia foi aplicada inicial-mente as equações diferenciais da mecânica clássica e eletromagnetismo e, então, aplicada de novas maneiras a relatividade especial e aos problemas da mecanica quantica. Stenger fornece a seus leitores uma visão geral desse poderoso conceito, mas então chega a duas conclusões incoerentes. Uma delas e a de que os princípios de simetria eliminam a idéia de leis da natureza, e a outra e a de que o nada pode produzir algo porque "o nada,/ e instável!

De forma impressionante, Fearful Symmetry, um livro de Anthony Zee, uma autoridade em simetrias, usa os mesmos fatos reunidos por Stanger para chegar a uma conclusão muito diferente:

Simetrias tem tido um papel cada vez mais central em nosso entendimento do mundo físico... Físicos fundamentais são sustentados pela fé de que o desígnio definitivo e coberto de simetrias. A física contemporânea não teria sido possível sem simetrias para nos orientar... A medida que a física se distancia cada vez mais da experiência cotidiana e fica mais próxima da mente do Planejador Supremo, nossa mente e puxada para longe de seus atracadouros mais familiares... Eu gosto de pensar em um Planejador Supremo como definido por simetria, um Deus Congruentiae.

Stenger argumenta que "o nada" e perfeitamente simétrico porque não há posição absoluta, tempo, velocidade ou aceleração no vazio. A resposta a questão "de onde vieram as simetrias?", ele diz, e que elas são exata-mente as simetrias do vazio, porque as leis da física são exatamente aquilo que se esperaria que elas fossem se viessem do nada.

O engano fundamental de Stenger e bastante antigo e consiste no erro de tratar o "nada" como sendo um tipo de "algo". Ao longo dos séculos, pensadores que consideraram o conceito de "nada" foram bastante cuidadosos em apontar que o "nada" não e um tipo de entidade. O nada absoluto significa a ausência de leis, de vácuos, campos, energia, estruturas, de entidades físicas ou mentais de qualquer tipo — e ausência de "sime­trias". O "nada" não tem propriedades ou potencialidades. O nada absoluto não pode produzir algo, dado um tempo infinito. Na verdade, não pode existir tempo no nada absoluto.

O que dizer sobre a idéia de Stenger, fundamental para seu livro God: The Failed Hipothesis, de que o surgimento do universo a partir do "nada" não viola os princípios da física, porque a energia liquida do universo e zero? Essa e uma idéia primeiramente lançada pelo físico Edward Tryon, que afirmou ter demonstrado que a ener­gia liquida do universo e quase zero e que, portanto, não haveria contradição na afirmação de que o universo surgira do nada, uma vez que ele era "nada". Somando-se a energia coesiva da atração gravitacional, que e negativa, e o resto de toda a massa do universo, que e positiva, chega-se a quase zero. Assim, nenhuma energia seria necessária para criar o universo, portanto nenhum cria-dor seria necessário.

Com respeito a essa e outras afirmações similares, o filosofo ateísta J. J. C. Smart aponta para o fato de que a postulação de um universo com energia liquida nula ainda não responde a pergunta de por que, afinal, deveria existir alguma coisa. Smart observa que as hipóteses e suas formulações modernas ainda pressupõem um espaço-tempo estruturado, um campo quântico e leis da natureza. Consequentemente, elas não respondem a questão de por que o universo existe, nem encaram a questão sobre se há uma causa a tempo oral para a existência do universo espaço-temporal.

Torna-se aparente, a partir dessa analise, que Stenger deixa sem resposta duas questões fundamentais: por que as coisas existem, em vez do nada absoluto? E por que as coisas que existem adaptam-se a simetrias ou formam estruturas complexas?

Zee lança mão dos mesmos elementos de simetria referenciados por Stenger para chegar a conclusão de que a Mente do Planejador Supremo e a fonte da simetria.

As leis da natureza, de fato, refletem simetrias fundamentais na natureza. E a simetria, não apenas as leis da natureza, que revela a racionalidade e inteligibilidade do cosmo — uma racionalidade enraizada na Mente de Deus.


A VIDA

Outro fenômeno a ser considerado e a vida. Diante do tratamento que Tony Flew da ao assunto neste livro, não há muito mais a ser dito sobre a questão da origem da vida. Devemos notar, porem, que as atuais discussões sobre essa questão parecem não abordar os assuntos de maior importância. Há quatro dimensões de seres vivos. Esses seres são agentes, tem metas e se reproduzem e são movidos semioticamente, isto e, sua existência depende da interação entre códigos e química. Cada ser vivo age ou e capaz de agir. E cada um deles e a força unificada e o centro de todas as suas ações. Como esses agentes são capazes de sobreviver e agir de modo independente, suas ações são, de certo modo, guiadas por metas — nutrição —, e eles se reproduzem, portanto, são agentes autônomos que buscam alcançar metas e são auto-reprodutores. Como Howard H. Patee observa, encontramos nos seres vivos a interação de processos semióticos — regras, códigos, linguagens, informações, controle — e sistemas físicos — leis, dinâmica, energia, forças, matéria.

Dos livros estudados aqui, apenas o de Dawkins aborda a questão da origem da vida. Wolpert e muito franco sobre a situação desse campo: "Não se pode dizer que todas as questões cientificas relacionadas a evolução foram resolvidas. Pelo contrario, a própria origem da vida, a evolução da célula miraculosa da qual todas as coisas vivas evoluíram, ainda e muito pouco compreendida". Dennett, em obras anteriores, simplesmente admitiu que algumas explicações materialistas devem ser certas.

A abordagem de Dawkins, infelizmente, ate mesmo em nível físico-químico, e inadequada, ou pior. "Mas como a vida começou?", ele pergunta. "A origem da vida foi um acontecimento químico, ou uma serie de acontecimentos que deram origem as c6ndigoes vitais para a seleção natural. Assim que o ingrediente vital — algum tipo de molécula genética — aparece, a verdadeira seleção natural de Darwin pode entrar em ação." Como isso acontece? "Cientistas recorrem a magia dos grandes números... A beleza do principio antrópico e que ele nos diz, contra toda intuição, que um modelo químico precisa apenas predizer que a vida emergira em um plane-ta daqui a um bilhão de anos para nos dar uma boa e totalmente satisfatória explicação para a presença da vida aqui."

Dado esse tipo de raciocínio, que pode ser mais bem descrito como um audacioso exercício de superstição, qualquer coisa que desejamos pode existir em algum lugar, bastando para isso que "recorramos a magia dos gran­des números". Unicórnios ou o elixir da juventude podem começar a existir "contra toda a intuição", e o único requisito para isso e "um modelo químico" que "precisa apenas predizer" que isso vai acontecer "em um planeta, daqui a um bilhão de anos".


CONSCIÊNCIA

As coisas não estão tão ruins no estudo da consciência, felizmente. Hoje, há uma crescente percepção da percepção..

Somos conscientes, e conscientes de que somos conscientes. Ninguém pode negar isso sem se contradizer, embora haja quem negue. O problema se torna insolúvel quando entendemos a natureza dos neurônios. Primeiro, os neurônios não tem nenhuma semelhança com nossa vida consciente. Segundo, e isso e mais importante, suas propriedades físicas não dão nenhuma razão para acreditarmos que eles podem ou que irão produzir cons­ciência. A consciência esta relacionada a certas regiões do cérebro, mas quando os mesmos sistemas de neurônios estão presentes no tronco do cérebro, não há "produção" de consciência. Na verdade, como o físico Gerald Schroeder observa, não há diferença essencial nos constituintes físicos fundamentais de um monte de areia e o cérebro de um Einstein. Só uma fé cega e infundada na matéria esta por trás da alegação de que certas porções de matéria podem, de repente, //criar,/ uma nova realidade que não tem semelhança com a matéria.

Embora os estudos sobre corpo e mente hoje reconheçam a realidade e o resultante mistério da consciência, Daniel Dennett e um dos poucos filósofos que continuam a negar o obvio. Ele diz que a questão de se alguma coisa e "realmente consciente" não e interessante, nem exige resposta, e afirma que maquinas podem ser cons­cientes porque são maquinas que são conscientes!

O funcionalismo, a "explicação" de Dennett para cons­ciência, diz que não devemos nos preocupar com o que cria os assim chamados fenômenos mentais, mas que devemos investigar as funções desempenhadas por es­ses fenômenos. Uma dor cria uma reação de rejeição, um pensamento e um exercício de solução de problema. Nada e para ser considerado um acontecimento particular em algum lugar particular. O mesmo vale para todos os outros supostos fenômenos mentais. Ser consciente significa desempenhar essas funções. Como essas funções podem ser executadas por sistemas não vivos — por exemplo, um computador resolve problemas —, não há nada de misterioso na consciência. E certamente não há razão para irmos alem do físico.

Mas o que essa explicação deixa de fora e o fato de que todas as ações mentais são acompanhadas por estados conscientes, nos quais temos percepção do que estamos fazendo. De modo algum o funcionalismo explica o estado de estar consciente, de perceber, o estado em que sabemos o que estamos pensando — computadores não sabem o que estão fazendo. E muito menos nos diz quem e que esta consciente, percebendo e pensando. Dennett, de modo engraçado, diz que a base de sua filosofia e "o absolutismo da terceira pessoa", que o deixa na posição de afirmar "eu não acredito em 'eu'".

Alguns dos mais fortes críticos de Dennett e do fun­cionalismo são, de modo interessante, físicalistas: David Papineau, John Searle e outros. John Searle e especial-mente ríspido: "Se você esta tentado a aderir ao funcio­nalismo, acredito que não precisa de refutação, mas de ajuda".

Ao contrario de Dennett, Sam Hárris tem defendido fortemente a suprafísica realidade da consciência. "O pro­blema, porem, e que nada relacionado ao cérebro, quan­do pesquisado como sistema físico, indica que ele e portador daquela dimensão particular, interior, que cada um de nos percebe como consciência." A conclusão e impressionante: "A consciência pode ser um fenômeno muito mais rudimentar do que as criaturas vivas e seus cérebros, e parece não haver uma maneira de rejeitar essa tese experimentalmente,/.

Para seu credito, Dawkins reconhece a realidade, tanto da consciência e da linguagem, como do problema que isso representa. "Nem Steve Pinker nem eu podemos explicar a consciência subjetiva humana, que os filósofos chamam de qualia"', ele disse uma vez. "Em seu livro Como a mente funciona, Steve elegantemente aborda o problema da consciência subjetiva, pergunta de onde ela vem e qual sua explicação. Então, e bastante honesto para dizer que não sabe. Eu digo o mesmo. Não sabemos. Não compreendemos." Wolpert deliberadamente evita a questão da consciência: "Tenho fugido propositalmente de qualquer discussão sobre a consciência".


PENSAMENTO


Alem da consciência, há o fenômeno do pensamento, da compreensão. Cada uso da linguagem revela uma condição do ser que e, por natureza, intangível. Na base de todo nosso pensamento, comunicação e uso da lin­guagem, esta um poder miraculoso. E o poder de notar diferenças e similaridades, de generalizar e universalizar — o que os filósofos chamam de conceitos ou idéias universais. Isso e natural nos humanos, e único e simples-mente misterioso. Como e que, ainda criança, você conseguia pensar, sem nenhum esforço, tanto em seu cachorro como em cachorros em geral? Podemos pensar em vermelhidão sem pensar em uma especifica coisa vermelha. Abstraímos, distinguimos e unificamos sem pensar na capacidade que temos de fazer essas coi­sas. E podemos ate refletir sobre coisas que não tem características físicas, como a idéia de liberdade ou a atividade dos anjos. Esse poder de pensar em conceitos e, por sua própria natureza, algo que transcende a matéria.

Se há aqueles que refutam isso, a coerência pede que parem de falar e pensar. Cada vez que usam a lingua­gem, estão ilustrando o papel, em nossa vida, dos significados, conceitos, intenções e raciocínio. E simplesmente absurdo dizer que a intelecção tem um correspondente físico, pois não há nenhum órgão que desempenhe a função de compreender, embora, naturalmente, os dados fornecidos pelos sentidos ofereçam um pouco da matéria-prima utilizada pelo pensamento. Se alguém pensar nisso por alguns minutos, saberá instantaneamente que é totalmente absurda a idéia de que o pensamento sobre alguma coisa e, em qualquer sentido, algo físico. Digamos que você pense em um piquenique que esta planejando fazer com a família e os amigos. Pensa em vários locais possíveis, nas pessoas que quer convidar, nas coisas que vai levar, no veiculo que vai usar, e assim por diante. E coerente supor que qualquer um desses pensamentos e, em algum sentido, fisicamente constituído?

Falando estritamente, nosso cérebro não compreende. Nos compreendemos. O cérebro nos capacita a com­preender, mas não porque nossos pensamentos ocorram nele, ou porque fazemos com que certos neurônios entrem em ação. O ato de compreender que acabar com a pobreza e algo bom, por exemplo, e um processo holístico que e suprafisico em essência — significado — e físico na execução — palavras e neurônios. O ato não pode ser dividido em suprafisico e físico porque e o ato indivisível de um agente intrinsecamente físico e suprafisico. Existe uma estrutura para o físico e uma para o suprafisico, mas sua integração e tão completa que não faz sentido perguntar se nossos atos são físicos ou suprafisicos, ou mesmo híbridos.

Muitas idéias errôneas sobre a natureza do pensa-mentos vem de idéias errôneas sobre computadores. Digamos que você esteja lidando com um supercomputador que faz mais de duzentos trilhões de cálculos por segundo. Nosso primeiro erro e presumir que computador e "algo", como uma bactéria, mas, no caso da bactéria, estamos lidando com um agente, um centro de ação que e organicamente unificado, um organismo. Todas as suas ações são incentivadas pela meta de mantê-la existindo e se reproduzindo. O computador e uma porção de pegas que, juntas ou separadamente, desempenham funções "implantadas" e dirigidas pelos criadores do conjunto.

Essa coleção de pegas não sabe o que o "algo" esta fazendo quando executa uma operação. Os cálculos e operações executados por esse supercomputador em reação a dados e instruções são simplesmente uma questão de pulsos elétricos, circuitos e transistores. Os mesmos cálculos e operações feitos por uma pessoa envolvem o mecanismo do cérebro, mas são executados por um cen­tro de consciência que esta consciente do que esta acontecendo, compreende o que esta sendo feito e intencionalmente os executa. Não há percepção, compreensão, sentido, intenção ou pessoa, quando um computador faz as mesmas ações, mesmo que tenha múltiplos processa-dores operando em velocidades sobre-humanas. O que e produzido pelo computador tem //sentido// para nos — a previsão do tempo, ou o saldo bancário —, mas, no que se refere ao conjunto de pegas chamado computador, são só dígitos binários que ativam certas atividades mecânicas. Sugerir que o computador compreende o que esta fazendo e como dizer que uma linha de força pode meditar sobre a questão de livre-arbítrio e determinismo, ou que as substancias químicas em um tubo de ensaio podem aplicar o principio da não contradigam para a solução de um problema, ou que um aparelho de DVD com­preende e aprecia a musica que toca.


O SER


De modo paradoxal, o mais importante engano dos novos ateístas e o mais obvio de todos os detalhes: eles mesmos. A maior realidade suprafísica / física que conhecemos por experiência e quem a experimenta, isto e, nos mesmos. Assim que percebemos que há uma perspectiva de primeira pessoa, "eu", "me", "mim", "meu", e assim por diante, encontramos o maior e mais excitante mistério. Eu existo. Parafraseando Descartes, "eu existo, logo penso, percebo, intento, interajo". Quem e esse "eu"? Onde esta? Como surgiu? O ser não e apenas alguma coisa física, assim com também não e apenas alguma coisa suprafísica. Você não esta numa particular célula cere­bral ou em alguma outra parte de seu corpo. As células de seu corpo não param de mudar, no entanto você e sempre o mesmo. Se estudar os neurônios, verá que nenhum deles tem a propriedade de ser um "eu". Claro que seu corpo faz parte integral do que você e, mas e um corpo porque e formado como tal pelo ser. Ser humano e estar num corpo e numa alma.

Numa famosa passagem de seu livro Tratado da natureza humana, Hume declara: "Quando entro mais intima-mente naquilo que chamo de mim mesmo, nunca posso me encontrar sem uma percepção e nunca posso observar nada alem dessa percepção". Aqui, Hume nega a existência de urn ser simplesmente argumentando que "e\i" não consegue encontrar o "mim". Mas o que unifica suas varias experiências, que permite que ele esteja consciente do mundo externo, que permanece o mesmo o tempo todo? Quem esta fazendo essas perguntas? Ele presume que "mim" e um estado observável, como seus pensa-mentos e sentimentos. Mas o ser não e alguma coisa que possa ser assim observada. E um constante fato de experiência e, na verdade, o terreno de toda experiência.

De todas as verdades disponíveis para nos, o ser e, ao mesmo tempo, o mais obvio e inexpugnável, e o mais letal para todas as formas de físicalismo. Para começar, a negação do ser não pode nem ser declarada sem contradição. A pergunta "como eu sei que existo", um profes­sor replicou: E quem esta perguntando? O ser e o que somos, e não o que temos. E o "eu" do qual emerge nossa perspectiva de primeira pessoa. Não podemos analisar o ser porque não e um estado mental que pode ser observado ou descrito.

A realidade mais fundamental da qual todos nos te­mos consciência, então, e o nosso ser, e uma compreensão do ser lança luz sobre todas as questões de origem e revela o sentido de realidade como um todo.

Sabemos que o ser não pode ser descrito, muito menos explicado, em termos de física ou química. A ciência não descobre o ser, o ser descobre a ciência. Entendemos que nenhuma explicação da historia do universo e coerente se não pode explicar a existência do ser.


A ORIGEM DO SUPRAFISICO

Então, como a vida, a consciência, o pensamento e o ser começaram? A historia do mundo mostra o repentino surgimento desses fenômenos, a vida aparecendo logo depois do resfriamento do planeta, a consciência misteriosamente manifestando-se na explosão cambriana, a linguagem emergindo na "espécie simbólica", sem nenhum precursor. Os fenômenos em questão vão dos sistemas de processamento de símbolos e códigos, de agentes que buscam metas e manifestam intenção, ate a percepção subjetiva, o pensamento conceitual e o ser humano. O único modo coerente de descrever esses fenômenos e dizer que eles são dimensões diferentes de existência, suprafísicas, de uma maneira ou de outra. Estão total-mente integrados ao físico e, ainda assim, totalmente "novos". Não estamos falando de espíritos em maquinas, mas de agentes de diferentes tipos, alguns conscientes, outros conscientes e pensantes. Não há vitalismo ou dualismo, mas uma integração que e total, um holismo que incorpora o físico e o mental.

Embora os novos ateístas tenham falhado em compreender a natureza ou a fonte da vida, a consciência, o pensamento e o ser, a resposta para a questão da origem do suprafisico parece obvia: o suprafisico só pode ter sua origem numa fonte suprafísica. A vida, a consciência, a mente e o ser só podem vir de uma Fonte viva, consciente e pensante. Se somos centros de consciência e pensa­mento capazes de conhecer, amar, intentar e executar, não vejo como esses centros poderiam vir de algo incapaz de tudo isso. Embora simples processos físicos pudessem criar complexos fenômenos físicos, não estamos preocupados com a relação entre simples e complexo, mas com a origem dos "centros". E simplesmente inconcebível que qualquer matriz material possa gerar agentes que pensam e agem. A matéria não pode produzir conceitos e percepções. Um campo de força não planeja nem pensa. Assim, através da razão e da experiência, ganhamos a percepção de que um mundo de seres vivos, conscientes, pensantes, tem de ter como origem uma Fonte viva, uma Mente.

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