Por Craig L. Bloomberg
Evidencias Arqueológicas
Uma categoria importante de evidencias de corroboraçao fora dos Evangelhos e do livro de Atos, ou de quaisquer outras fontes cristãs explicitas, e o que a arqueologia descobre. Novamente, ha livros cheios de itens que confirmam o tipo de detalhes em o Novo Testamento que se prestam como prova ou refutação arqueológica. Em nenhum caso algum detalhe foi refutado; incontáveis itens foram corroborados. Novamente, podemos ter apenas uma idéia inicial, com os exemplos mais famosos ou significativos.75
- Os Quatro Evangelhos
Uma admirável quantidade de detalhes circunstanciais nos Evangelhos recebe respaldo de escavações realizadas em Israel. A maioria delas serve para reforçar o nosso entendimento do cenário histórico, religioso e sociocultural do mundo de Jesus. Assim, podemos ver ruínas de inúmeros projetos de edifícios de Herodes, a disposição e a função do templo, as dimensões e o conteúdo de uma típica casa palestina, a natureza das estradas romanas e outras coisas. Pedras de moinho, tanques para imersão ritual, e a "cadeira de Moises" em uma sinago¬ga, tudo foi desenterrado, esclarecendo as referencias do Evangelho a esses itens. Em alguns casos, localidades inteiras foram escavadas — a sinagoga de Cafarnaum, do século IV, provavelmente edificada sobre as fundações de uma sinagoga da época de Jesus; o poço de Jacó em Sicar, onde Jesus se encontrou com a samaritana; o tanque de Betesda, com seus cinco alpendres, próximo a Porta das Ovelhas em Jerusalém; o tanque de Siloé, também em Jerusalém; e possivelmente a pedra (Gabata ou Litostrotos — veja Joao 19.13) do lado de fora do palácio de Pilatos (supondo que se tratava da Fortaleza Antonia).76 O mesmo e valido para a localização de cidades inteiras. Um mosaico de um barco de pesca do século I, com a inscrição “Magdala” ajudou a conduzir a descoberta da localização da terra natal de Maria Madalena. Ruínas de uma igreja bizantina, a leste do mar da Galileia, provavelmente apontam para a localização de Khersa, onde Jesus expulsou uma legião de demônios de um homem.
Algumas descobertas são bastantes recentes. Somente depois de 1961 foram desenterradas as evidências de inscrição (em oposição às literárias), em Cesárea Marítima, de Pilatos como governador da Judéia, durante o reinado do imperador Tibério. Em 1968, um ossuário (isto e, uma caixa de ossos) de um homem crucificado, chamado Johanan, confirmou, pela primeira vez, que os romanos podiam cravar pregos nos pés ou tornozelos de vitimas de execução. Um barco de pesca do século I foi dragado do mar da Galileia em 1986, depois da pior seca em Israel em mais de um século. E interessante que nele havia espaço para treze pessoas, exatamente, a quantidade de espaço que teria sido necessária para que Jesus e seus doze discípulos coubessem todos em uma embarcação. No museu em que os turistas agora podem vê-lo, o barco foi apelidado de "o barco de Jesus", embora, e claro, não tenhamos como saber se o próprio Jesus chegou a usar este barco. Em 1990, a sepultura que parece ser, provavelmente, do sumo sacerdote Caifas foi descoberta no monte Sião em Jerusalém, perto do local tradicionalmente conhecido como a Cidade de Davi no Antigo Testamento.77 O mais recente centro de atividade arqueológica foi Betsaida. Embora, ate hoje, não houvera nenhuma descoberta dramática, muitos pequenos artefatos, incluindo inúmeros itens relacionados a atividade pesqueira, foram escavados. Apenas quando este livro ia começar a ser impresso, surgia uma controvérsia a respeito de outra descoberta, próxima a Jerusalém — o possível ossuário de Tiago, o irmão de Jesus. A possibilidade de que a inscrição da urna funerária, que diz "Tiago", tenha sido feita por duas mãos diferentes, no entanto, deixa os acadêmicos incertos quanto a qual Tiago teria sido enterrado nela.78
Freqüentemente, a arqueologia fornece boas "lições praticas" para o leitor interessado da Bíblia. Em outras palavras, locais que não são as reais localizações de eventos dos Evangelhos, apesar disso, assemelham-se provavelmente aos verdadeiros lugares. Assim, embora a adornada Igreja do Santo Sepulcro, na parte velha de Jerusalém, esteja próxima ao local autentico da crucificação e do sepultamento de Jesus, o Calvário de Gordon — um afloramento de rocha na forma de caveira, pouco acima da atual estação de ônibus da moderna Jerusalém — e tão semelhante ao terreno que provavelmente parece com o lugar original do Golgota, explicando por que este lugar foi apelidado de "Lugar da Caveira". Ou, de novo, os turistas normalmente são levados a visitar um considerável patamar, a algumas centenas de metros acima da costa noroeste do mar da Galileia, e abaixo do tradicional "Monte das bem-aventuranças". Aqui, a acústica natural possibilita que alguém que esta no meio do caminho para o topo seja ouvido por grande multidão de pessoas ao mesmo tempo. Este poderia ser o lugar onde Jesus pregou seu famoso”Sermão da Montanha”, mas nós simplesmente não temos como afirmar isso, porque os Evangelhos não nos fornecem informações suficientes para determinar o local.
Artefatos desenterrados podem freqüentemente fornecer esclarecimento sobre palavras ou costumes específicos. A palavra corbã ("consagrado a Deus") foi encontrada sobre um sarcófago judaico, como advertência para ladrões de sepulcros. Sepulcros "caiados" resplandecentes ainda salpicam o vale do Cedrom e uma parte das encostas do monte das Oliveiras, ilustrando visualmente a metáfora de Jesus, em Mateus 23.27. Abundante quantidade de moedas confirma o costume de cunhar nelas a imagem de Cesar, um ponto em que Jesus se baseou quando evitou a pergunta capciosa dos lideres judeus sobre o pagamento de tributos.
A arqueologia ainda tem o potencial de esclarecer os silêncios dos Evangelhos. Nos últimos vinte anos, grande parte das escavações se concentrou em Sepphoris, a capital herodiana original da Galileia, antes da construção de Tiberiades, nos anos 20 d.C. Curiosamente, Sepphoris ficava somente a 8 quilômetros de Nazaré e solicitou grande quantida¬de de trabalhadores na construção civil, durante a mocidade e inicio da vida adulta de Jesus. Foi aqui que Ele aprendeu o costume grego de "atuar", de onde deriva a palavra hupokrites ("hipócrita"), uma palavra não encontrada em hebraico ou aramaico, mas que Jesus usou repetidas vezes contra certos lideres religiosos (veja especialmente Mateus 23)? Afinal, um grande teatro em estilo tipicamente grego foi escavado ali. O silencio dos Evangelhos a respeito de Sepphoris pode indicar que, quando Jesus iniciou o seu ministério publico, Ele teria evitado esta grande cidade gentílica, porque entendia que a sua missão era "primeiro para os judeus?"79 Ou o fato de que arqueólogos tenham desenterrado comparativamente alguns poucos ossos de porcos em Sepphoris — uma característica de cidades altamente judaicas, em que as refeições eram "kosher" e onde se evitava comer carne de porco ou presunto — sugere que nos superestimamos o quanto esta cidade era grega?
Um artefato de uma natureza bem diferente merece um breve comentário. Pequenos fragmentos do Sudário de Turim, cuidadosamente guardados durante séculos na Italia por autoridades católicas, foram submetidos a uma bateria de testes científicos em 1988, em três diferentes laboratórios, ao redor do mundo. Todos os resultados, independentemente provaram que só tratava de um pedaço de tecido do século XI ou XII, recente demais para ter sido o Sudário de Jesus.80 Ainda não há explicações convincentes sobre a origem da assombrosa impressão de um homem crucificado, estampada neste tecido, mas e inútil continuar argumentando a favor da sua autenticidade.81 Uma vez que muitas pessoas ao redor do mundo já ouviram falar neste sudário, embora nada mais saibam sobre artefatos bíblicos antigos, este ponto deve ser enfatizado.
- O Livro de Atos
Quando nos voltamos para a arqueologia dos inúmeros locais mencionados no livro de Atos, mal sabemos por onde começar, pois muitos já foram escavados. Deixar Israel significa, antes de mais nada, seguir Paulo nas suas jornadas (At 13 - 28).82 Em Antioquia da Pisidia, referências a parentes de Sergio Paulo, o governador cipriota, foram encontradas, sugerindo um dos motivos por que Paulo e Barnabé foram para lá, depois de navegar, saindo de Chipre para o que hoje poderia ser chamado de Turquia continental. Inscrições em pedras possibilitaram que os arqueólogos localizassem Listra e Derbe, duas outras cidades do sul da Galacia que Paulo visitou na sua primeira viagem missionária. Grande parte da antiga Efeso foi reconstruída das ruínas, incluindo o teatro onde os ourives de prata se revoltaram. Uma estatua de Artemis em Efeso, que parece ter mais de doze seios no seu peito, confirmou a adoração daquela deusa da fertilidade e exemplifica o tipo de idolatria contra a qual Paulo lutava. Em Tessalonica, evidencias de inscrições, pela primeira vez, justificaram o uso que Lucas faz do termo "politarca", que não aparece em outras passagens, com referenda aos governantes civis locais (Atos 17.8 - "principais da cidade"). Em Filipos, um possível local do breve aprisionamento de Paulo foi escavado assim como a ampla agora ou o mercado, e um possível local próximo ao rio onde ha via aquela oração, onde Paulo encontrou Lidia e seu grupo.
Corinto, como Efeso, contem muitas ruínas que ainda existem ou foram reerigidas. Ali a famosa inscrição de Galio nos possibilitou confirmar a existência e a data do governador local diante do qual Paulo foi julgado. Podemos ate mesmo ver ruínas do bêma, ou "tribunal", onde Galio teria se sentado para presidir o julgamento. Na imensa montanha rochosa, chamada de Acrocorinto que se ergue no fundo, ainda estão as ruínas da fortaleza romana que posteriormente substituiu o templo pagão no seu cume, no século I. Ali, os "sacerdotes sagrados" ou as "sacerdotisas" tinham relações sexuais com os "adoradores" para obter união com os deuses. Pouco admira que a moralidade sexual fosse uma grande preocupação de Paulo na sua primeira carta a jovem igreja desta cidade (veja especialmente 1 Coríntios 5-7). Uma inscrição mencionando "Erasto", o "aedile" (palavra em latim, que significa um oficial municipal) corresponde, assombrosamente, as saudações que Paulo transmite de Erasto, "procurador da cidade'', em Romanos 16.23, escritas de Corinto. Atenas, naturalmente, contem o espetacular Partenon, mas também o Areopago, onde Paulo falou, e uma stoa esplendorosa-mente reconstruída e modernizada — uma passagem apoiada em pilares e coberta, em que se alinham lojas ao redor da ágora.83
- As Igrejas do Livro do Apocalipse
Normalmente, não se pensa no livro do Apocalipse como um documento do gênero histórico. Mas os capítulos 2 e 3, que contem as cartas da João as sete igrejas da Ásia Menor, incluem varias referencias que são esclarecidas pelo estudo histórico e, mais especificamente, arqueológico.84 A promessa da "arvore da vida" aos que "vencerem" (Ap 2.7) esta em agudo contraste com a arvore do santuário ao culto de Artemis em Efeso e o abrigo que esta dizia oferecer. A oferta de uma coroa a Esmirna (v. 10) era apropriada para uma cidade que a tinha como seu conhecido emblema de beleza. Pergamo era um centro de adoração a Zeus, de curas de Asclepio e o culto imperial, sendo qualquer um deles, ou todos, bons candidates ao "trono de Satanás" (v. 13). Tiatira era local de associação de comerciantes, incluindo a de oleiros, que participavam de cerimônias pagas idolatras. Compare o quebrar da cerâmica no versículo 27.
Contudo o mais importante esclarecimento arqueológico envolve a sétima cidade, Laodiceia, que era famosa pela sua riqueza (ela foi reconstruída, sem ajuda romana, depois de um terremoto, em 60 d.C), pela sua industria de lã negra, e uma escola de medicina que fabricava balsamo para os olhos. A guisa de comparação de cada um destes três itens, Apocalipse 3.17 declara que os cristãos ali eram um povo "desgraçado, e miserável, pobre, cego, e nu". Jesus bate a porta dessa igreja para tentar recuperá-los e conduzi-los a uma fé mais vibrante (v. 20). Essa gentil abordagem contrasta com a entrada forçada de oficiais romanos exigindo alojamento nesta rica cidade, passando por uma impressionante porta tripla nas muralhas da cidade. O que e mais significativo e que Laodiceia não tinha seu próprio abastecimento de água; a água tinha que ser canalizada das frias fontes montanhosas, perto de Colossos, ou das terapêuticas fontes de água quente perto de Hierapolis.
De qualquer maneira, quando os aquedutos chegavam a Laodiceia, a água já estava morna. Assim, quando Jesus fala, por intermédio de João, que desejava que os laodicenses fossem frios ou quentes (v. 15), antigas expressões são metáforas positivas. Este fato e conhecido, pelo menos, desde a obra de Rudwick e Green, ha meio século, de modo que os pregadores que perpetuam o mito de que aqui "frio" significa ativamente em oposição a Deus, conduzem muitas pessoas a um equívoco!85
Uma lista de tanto material arqueológico de respaldo a historicidade básica do Novo Testamento não deveria dar a impressão de que não ha problemas não solucionados a respeito da confiabilidade destes documentos. Por exemplo, existem pelo menos duas, e talvez ate mesmo três, localizações plausíveis para a cidade de Emails. O problema da data do governo de Cirenio, na Síria (Lc 2.1), documentada fora da Bíblia não antes de 6 d.C, pode ter sido solucionado por inscrições micrograficas em moedas, que indicam que ele teve também uma posição política anterior, mas as marcas são pequenas demais e incertas, para que tenhamos certeza.86 (Ha problemas similares quando tentamos datar o Teudas mencionado em Atos 5.36; Josefo parece atribuir uma data posterior a esta rebelião.87 Fontes literárias, portanto, contem os mesmos prospectos e as mesmas ciladas que as fontes arqueológicas). Mas a esmagadora maioria de descobertas arqueológicas consistentemente aponta na direção de confirmar a confiabilidade destas porções de documentos do Novo Testamento com os quais e possível fazer comparações.
- Outras evidências do período do inicio do Cristianismo
As duas seções anteriores se concentraram nas evidencias, literárias e arqueológicas, que não poderiam ter sido distorcidas por "inclinações" cristãs. Mas o argumento de que a evidencia cristã deve ser "excluída do tribunal" e enganador, como já vimos no tópico "O Sucesso do Empreendimento dos Evangelistas". Há um ultimo tipo de testemunho, portanto, que não deve ser negligenciado, e envolve outros textos cristãos, fora dos Evangelhos e do livro de Atos. Nós investigamos estes materiais na ordem cronológica inversa, do menos importante para o mais importante.
No inicio do século III, se não no final do século II, praticamente todas as narrativas cristãs do ministério publico de Jesus e a historia da primeira geração da igreja confiavam exclusivamente no material dos Evangelhos canônicos e do livro de Atos. Mesmo a literatura apócrifa, na sua maior parte, não coincidia com o material canônico, mas procurava (ainda que ficticiamente) se encaixar nos "anos ocultos" da vida de Jesus, revelar os seus ensinamentos supostamente secretos a determinados seguidores, depois da ressurreição, ou descrever feitos muito posteriores dos apóstolos. Já na metade do século II, no entanto, a tradição oral dos eventos relativos a fundação da Igreja continuava a circular juntamente com os documentos escritos do Novo Testamento. Papias, bispo de Hierapolis no inicio do século II, afirmou que confiava na tradição oral que Ihe fora transmitida pelos sucessores dos apóstolos de Cristo, mais do que em quaisquer textos escritos (Eusebio, Eccl. Hist 3.39.3-4).88
- Os Pais Apostólicos
A coletânea dos primeiros escritos, cristãos ortodoxos, posteriores ao Novo Testamento, e conhecida como Pais Apostólicos. Escritos principalmente durante as duas primeiras terças partes do século II, esses documentos incluem duas epistolas escritas por Clemente, bispo de Roma; um conjunto de cartas breves de autoria de Inácio, um famoso mártir cristão; uma epistola de Policarpo, discípulo do apostolo João; o Didaquê, ou "Ensinamento" dos apóstolos, um manual sobre questões praticas de ética cristã e ordem na igreja; uma epistola dura contra o judaísmo, falsamente atribuída a Barnabé; e uma coletânea de visões, mandamentos e parábolas de doutrinas cristãs atribuída ao "Pastor de Hermas".89 Freqüentemente, essas obras citam tradições encontradas em o Novo Testamento, mas com palavras ligeiramente diferentes, de modo que não podemos ter a certeza de que estejam dependendo das formas escritas destas tradições. Em um punhado de exemplos, elas ci¬tam ensinamentos ou eventos não encontrados em o Novo Testamento. Estas duas características reforçam o comentário de Papias, sugerindo que o testemunho oral independente continuava a circular, mesmo de¬pois que os Evangelhos e o livro de Atos foram escritos. Como os Pais Apostólicos se referem a um numero de detalhes da vida de Cristo e da Igreja Primitiva, bastante maior do que os autores não-cristãos, independentemente de ate que ponto eles propiciam testemunho indepen¬dente, e confirmada uma porcentagem muito maior de informações so¬bre as origens cristãs do que poderia ser corroborado por nossas linhas anteriores de argumentação. Estas referências incluem grande material sobre o ensinamento de Jesus no Sermão da Montanha, uma significativa porcentagem de outros ensinamentos exclusivos ao Evangelho de Mateus, assim como exortações éticas de Jesus de modo geral, clara-mente a parte mais comum dos Evangelhos e do livro de Atos citada nos primeiros textos cristãos não canônicos.90
- Apocalipse
Voltando ao final do século I, chegamos ao ultimo documento do Novo Testamento, o livro do Apocalipse. Greg Beale acredita ter identificado inúmeros pontos onde João, ao compor este livro do Apocalipse, se inspirou nas mesmas tradições independentes, empregando as profecias de Daniel do Antigo Testamento, que estão por trás dos Evangelhos Sinóticos. O uso da analogia do Filho do Homem, extraída de Daniel 7.13,14, singular tanto aos Evangelhos quanto ao livro do Apocalipse, e o seu exemplo mais proeminente.91 Louis Vos vai mais alem, crendo ter identificado vinte e cinco passagens no livro do Apocalipse que demonstram um conhecimento independente das tradições incorporadas aos Evangelhos Sinóticos,92 porem muitas delas são excessivamente alusivas para nos de fato.
- 1 Pedro
A primeira epistola de Pedro e datada, por acadêmicos liberais, nas ultimas décadas do século I, freqüentemente por volta dos anos 80. Os conservadores, que acreditam que o próprio Pedro escreveu esta carta, atribuem-na a uma data não posterior a meados dos anos 60, uma vez que Pedro foi martirizado por Nero em Roma, entre 64 e 68 d.C. Esta carta contem numerosas alusões aparentes a tradição dos Evangelhos, em formas suficientemente diferentes, de modo que a dependência literária direta não pode ser demonstrada com certeza. Particularmente notáveis são as alusões a palavras do Evangelho de João, que, se João tivesse escrito nos anos 90, não poderiam ter existido, em forma escrita, nem na data mais tardia atribuída a primeira epistola de Pedro. Três exemplos comumente citados são as declarações sobre nascer de novo, em 1 Pedro 1.2 (cf. Jo 3.3); amar a Jesus sem tê-lo visto, em 1.8 (Cf. Jo 20.29); e ser levado das trevas a luz, em 2.9 (cf. Jo 8.12).93
- Tiago
A epistola de Tiago pode, na verdade, ser a primeira de todos os documentos do Novo Testamento, escrita no final dos anos 40. Mas a evidencia e ambígua. Tiago, o irmão do Senhor, poderia ter escrito esta epistola já no inicio dos anos 60, uma vez que viveu ate 62 d.C. Aqueles que atribuem esta epistola a outro autor, em algumas ocasiões datam-na nos anos 70 ou 80. Mas praticamente todos acreditam que a epistola e anterior a primeira epistola de Pedro, assim como a primeira epistola de Pedro e anterior ao livro do Apocalipse. De todas as epístolas do Novo Testamento, nenhuma contem tantas passagens que se assemelham, verbalmente, aos ensinamentos de Jesus, como a epistola de Tiago. Embora aqui não haja citações inequívocas, ha aproximada-mente três dúzias de referencias ao Sermão da Montanha/Planície em Mateus5-7eLucas 6.20-49.94
Não e preciso ir alem do primeiro parágrafo da epistola de Tiago para observar um padrão de referencias que permanece consistente por toda a carta. "Meus irmãos, tende grande gozo quando cairdes em várias tentações" (1.2; cf. Mt 5.11,12 — "bem-aventurados sois vos quan¬do vos injuriarem... Exultai e alegrai-vos" — e Lc 6.23); "para que sejais perfeitos e completos" (1.4; cf. Mt 5.48 — "Sede vos, pois, perfeitos, [ou maduros] como e perfeito o vosso Pai, que esta nos céus"); "pega-a a Deus, que a todos da liberalmente... e ser-lhe-á dada" (1.5; cf. Mt 7.7 — "Pedi, e dar-se-vos-á" - e Lc 11.9); "Pega-a, porem, com Fe, não duvidando" (1.6; cf. Mt 21.21 — "se tiverdes fé e não duvidardes" — e Mc 11.23). Essas referencias envolvem as três fontes principais de Mateus — Marcos, Q e M (exclusivamente material de Mateus) — mostrando que o conhecimento que Tiago tinha da tradição do Evangelho era ampla. Mas mesmo que a carta tenha sido escrita tão tardiamente, como 0 ano 60 ou 61, e improvável que Tiago tivesse acesso ao Evangelho completo de Mateus. Ele deve ter conhecido as fontes de Mateus, ou as tradições orais por trás delas. Começam a se somar as evidencias de que os Evangelhos estavam baseados em tradições fielmente transmitidas, e não inventadas pelos evangelistas.
- Paulo
Finalmente, chegamos as importantes epistolas de Paulo. Comentaristas de todo o espectro teológico concordam que Romanos, 1 Coríntios e 1 Tessalonicenses foram escritas nos anos 50, cedo demais para se basear em algum Evangelho escrito. Mas ha mais ou menos uma dúzia de citações ou alusões muito claras aos ensinamentos de Jesus que os Sinóticos registrariam mais tarde. Romanos 12.14 traz o mandamento: "Abençoai aos que vos perseguem; abençoai e não amaldiçoeis" (cf. Lc 6.27b; 28a); 12.17, "a ninguém torneis mal por mal" (cf. Mt 5.39); e 13.7, "dai a cada um o que deveis: a quem tributo, tributo; a quem imposto, imposto" (cf. Mc 12.17). Em 13.8,9, Paulo resume toda a lei no mandamento de amar ao próximo (como em Gl 5.14; cf. Mc 12.31); em 14.10, ele condena julgar um irmão, uma vez que todos seremos julgados (cf. Mt 7.1,2a); e em 14.14, ele declara: "Eu sei e estou certo, no Senhor Jesus, que nenhuma coisa e de si mesma imunda" (cf. Lc 11.41; Mc 7.19b).
Três das mais explicitas citações de Jesus, feitas por Paulo, aparecem em 1 Coríntios. Em 1 Corintios 7.10,11, Paulo respalda suas opiniões sobre o casamento e o divorcio, com o mandamento "não eu, mas o Senhor, que a mulher se não aparte do marido. Se, porem, se apartar, que fique sem casar ou que se reconcilie com o marido; e que o mari¬do não deixe a mulher". Ao enfatizar que isso vem do Senhor, ele não quer dizer que o resto do seu ensinamento não e inspirado, mas que nesta questão especifica ele pode buscar o respaldo do ensinamento do Jesus terreno.95 Em 1 Corintios 9.14, Paulo escreve: "Assim ordenou também o Senhor aos que anunciam o evangelho, que vivam do evan¬gelho". Aqui, ele esta se referindo ao ensinamento que posteriormente seria registrado em Lucas 10.7, ("digno e o obreiro de seu salário"; cf. Mt 10.10). A terceira citação de uma passagem semelhante a de um Evangelho Sinótico e a mais clara de todas. Ao tentar corrigir o mau uso que os coríntios faziam da Ceia do Senhor, Paulo cita abundantemente da tradição das palavras de Jesus na sua Ultima Ceia, particularmente paralela a forma em que Lucas escreveria (cf. Lc 22.19,20). Em razão do seu subseqüente uso litúrgico, estas palavras ficaram conhecidas como "palavras de instituição" (da Ceia do Senhor):
Por que eu recebi do Senhor o que também vos ensinei: que o Senhor Jesus, na noite em que foi traído, tomou o pão; e, tendo dado gramas, o partiu e disse: Tomai, comei; isto e o meu corpo que e partido por vos; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente também, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice e o Novo Testamento no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que beberdes, em memória de mim. (1 Co 11.23-25)
Os verbos "recebi" e "ensinei" neste tipo de contexto são termos técnicos para a transmissão fiel da tradição oral, como era a pratica dos rabinos com a Tora.96 Paulo provavelmente recebeu esta informação bem cedo na sua vida cristã, como parte do discipulado cristão elementar da sua época. Mas isso sugere que já nos anos 30 existia o conhecimento detalhado das palavras reais das tradições que seriam escritas uma geração mais tarde nos Evangelhos, uma vez que a data da conversão de Paulo pertence ao período entre dois a três anos apos a crucificação de Cristo!
Em 1 Tessalonicenses 2.14-16, Paulo compara a perseguição que os cristãos tessalonicenses suportavam a que os cristãos judeus sofreram nas mãos de seus compatriotas, que levaram Cristo a morte. Esses versículos contem numerosas alusões a partes de Mateus 23.29-38. Em 1 Tessalonicenses 4.15 - 5.4, ha paralelos ainda mais claros. Paulo introduz a sua descrição do retorno de Cristo em 4.15-17 como "pela palavra do Senhor", e muitos dos detalhes desses três versículos são correspondentes ao "Sermão do Monte das Oliveiras" de Jesus (Mc 13), em que o Senhor descreveu os eventos que envolveriam a sua segunda vinda. Em 5.2-4, a dupla referenda ao dia do Senhor que vem como um ladrão a noite, certamente recorda a parábola do ladrão narrada por Jesus (Mt 24.43; Lc 12.39), uma vez que uma metáfora tão impressionante não aparece em nenhuma das fontes anteriores. Inúmeros outros textos, as vezes com alusões ligeiramente mais vagas, poderiam ser relacionados aqui. Mas a questão e clara — um corpo significativo, detalhado e fixo de tradições orais dos ensinamentos de Deus circulava desde os primeiros dias da igreja cristã. Os autores do Evangelho, por sua vez, confiaram nesta tradição, que não era uma invenção fantasiosa, para compilar o seu ensinamento.
Isso prova ser igualmente verdadeiro com respeito aos detalhes sobre a vida e as obras de Cristo. Um resumo das mais importantes informações biográficas que podem ser reunidas das incontestáveis epistolas de Paulo incluiria a sua descendência de Abraão e Davi, o fato de ter sido criado na lei judaica, a sua convocação de discípulos, incluindo Pedro e João, e o fato de que Ele tinha um irmão chamado Tiago. Nos também aprendemos sobre o impecável caráter de Jesus e a sua vida exemplar, a sua Ultima Ceia e a traição e inúmeros detalhes que envolveram a sua morte e ressurreição.97
- Os Credos Cristãos Antigos
As mais antigas de todas são as passagens usadas por Paulo e Pedro em suas epistolas, que os acadêmicos identificaram como, muito provavelmente, pre-datando as epistolas em que aparecem. Numerosos textos em grego altamente poético, cheios de formulações densas da doutrina cristã fundamental, em estilos que freqüentemente são diferentes dos estilos dos próprios autores das epistolas, e que parecem se separar como entidades independentes dentro das epistolas em que aparecem, são prováveis candidatos a credos cristãos antigos ou confissões de fé. Os exemplos mais claros e mais comumente citados são Filipenses 2.6-11, Colossenses 1.15-20 e 1 Pedro 3.18-22.98 Essas cartas f oram possivelmente escritas no inicio dos anos 60, de modo que credos estabelecidos, incorporados a elas, provavelmente não são posteriores aos anos 50. Mas essas (e outras) confissões também mostram sinais de um cristianismo judeu primitivo que floresceu principalmente nos anos 30 e 40, de modo que elas poderiam ser ainda mais antigas.
Mas e precisamente neste material mais antigo que com freqüência encontramos algumas amostras da mais exaltada linguagem sobre Jesus. Ele tinha "a natureza de Deus" (Fp 2.6, NTLH), era "e imagem do Deus invisível" (CI 1.15), e "esta a destra de Deus, tendo subido ao céu, havendo-se-lhe sujeitado os anjos, e as autoridades, e as potencias" (1 Pe 3.22). Essas crenças emergiram cedo na Historia da Igreja, não em algum estagio avançado da "evolução da doutrina cristã"." Tais passa¬gens também conferem confiabilidade as declarações exaltadas feitas por Jesus, e sobre Ele, nas paginas dos próprios Evangelhos.
A mais significativa e assombrosa passagem pré-paulina e 1 Coríntios 15.3-7. Uma vez mais, Paulo usa a linguagem técnica da recepção e transmissão da tradição judaica oral: "Porque primeiramente vos entreguei o que também recebi". Aqui chegamos ao âmago da fé cristã antiga acerca de Jesus:
... que Cristo morreu pelos nossos pecados, de acordo com as Escrituras, que Ele foi sepultado, que ressuscitou ao terceiro dia de acordo com as Escrituras, e que apareceu a Cefas [Pedro] e depois aos Doze. Depois disso, Ele apareceu a mais de quinhentos dos irmãos e irmãs, ao mesmo tempo, muitos dos quais ainda estão vivos, embora alguns estejam adormecidos. Então, Ele apareceu a Tiago, e depois a todos os apóstolos...
O âmago desta informação de discipulado deve ter sido ensinada a Paulo pouco depois que se tornou um cristão. Uma dramática corroboração disso nos vem de um importante acadêmico alemão que percorreu o caminho do cristianismo liberal ao ateísmo durante os anos 1990. Escrevendo abundantemente sobre o tema da ressurreição, Gerd Ludemann afirmou que durante os dois primeiros anos do movimento cristão, os seguidores de Jesus proclamavam confiantemente a sua ressurreição corpórea dos mortos. Embora Ludemann não cresse que um evento genuinamente sobrenatural tenha acontecido, reconhece que a declaração mais responsável que um historiador pode fazer e que os primeiros cristãos creram, quase que imediatamente, que algo deste tipo ocorreu.100 Não adiantara fingir que a historia da ressurreição foi uma invenção mitológica e muito posterior, muito tempo depois que as pessoas que realmente sabiam o que tinha ou não acontecido já estavam mortas!
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